Nada vem por estes dias mais a propósito do que meter uma rolha no senhor Américo Amorim, e não digo isto por se tratar do "rei da cortiça" mas por este se ter auto-intitulado "simples trabalhador" quando confrontado com a hipótese da adopção de um imposto sobre as grandes fortunas, a exemplo do que se está a passar em França e na onda dos conselhos sábios de Warren Buffet, outro pobrezinho que vive do rendimento mínimo, como se sabe. Apesar de uma fortuna estimada em 2,6 mil milhões de euros, dinheiro mais do que suficiente para comprar alguns países e regiões do mundo, o senhor Amorim teve a distinta lata de, num desprendimento total dos bens materiais e terrenos, qual Jesus Christ da secção de enchidos do Jumbo, se dar como simples trabalhador: "não me considero rico" - disse. Devia ter acrescentado um: "sou da prol pá!" Coitadinho, parece que o estou a ver: sachola às costas e marmita na sacola com rancho e arroz branco, meia garrafinha de tinto e lá vai o Américo montado na Famel pronto a dar o litro durante 12 horas na herdade, debaixo de sol e chuva.
Américo Amorim tem tanto de simples trabalhador como Michael Jackson tinha de caucasiano. Mas se o segundo conseguiu disfarçar com pó de arroz na tromba e operações como quem mastiga Trident das azuis e acabou teso como um carapau, o primeiro por muito que queira dar um de humilde não conseguia iludir a madre Teresa de Calcutá, mesmo que a senhora não estivesse devidamente equipada com o sobretudo de madeira, e está mais rico a cada dia que o sol se põe.
Na verdade estou-me a marimbar se o senhor Amorim vai pagar impostos especiais, extra, do lombo, da perna, da pá ou não, para ser sincero até acho meio apatetada esta história de se inventar um imposto que taxa os mais afortunados só por o serem. Parece absurdo. Agora o que já gosto pouco de ver é pessoas que não passam qualquer dificuldade na vida equipararem-se a quem efectivamente as passa, os verdadeiramente afectados pelas medidas austeras tomadas pelo governo, cada dia em maior número e de forma mais cruel para os que menos têm. Pessoas como o senhor Amorim, cujos filhos, netos, primos, sobrinhos, enteados e afilhados jamais terão de andar a bater pé na rua à procura de emprego ou em manifestações a pedincharem direitos que jamais deveriam ter sido tocados ou alienados, alguns verdadeiramente inexistentes. Direitos, muitos deles, aniquilados por gerações de políticos sacanas e corruptos, verdadeiras bestas que engordaram meia dúzia e secaram tudo à passagem.
Esses sim, deviam ser taxados e de que maneira. Mas esses safam-se sempre. E os ricos? São sempre os mesmos. E vão ser sempre os mesmos.
Via Expresso