Quando chegamos ao espaço Kiss the Cook, na Lx Factory, em Lisboa, já os três cozinheiros coreanos estão à volta dos tachos na cozinha, e em cima de uma mesa está um prato com duas formas alaranjadas, mais ou menos ovais. São dois exemplares do kimchi, uma espécie de símbolo nacional gastronómico da Coreia – mas praticamente desconhecido em Portugal.
Os dois kimchi – couves fermentadas com diversas especiarias – são de plástico, mas os três jovens chefs vão dar-nos a provar um verdadeiro nesta aula improvisada sobre a cozinha coreana. Mas primeiro as apresentações. Ryu Si Hyeong é o líder deste pequeno grupo, composto ainda por Kim Seung Min e Jo Seok Beom, que anda a percorrer o mundo num autocarro vermelho, baptizado como Kimchi Bus. O objectivo é visitar 80 cidades de 38 países em 400 dias.
Já andaram pela Rússia e por grande parte da Europa de Leste, e recentemente passaram por Madrid mesmo a tempo do festival gastronómico Madrid Fusión, onde a Coreia foi o país convidado. Depois disso decidiram vir até Lisboa, onde ficaram durante alguns dias instalados em casa de um amigo. Foi um acaso que os trouxe até ao Kiss the Cook. Miguel Pires, autor do guia gastronómico Lisboa à Mesa, viu a carrinha vermelha estacionada nas Olaias e desafiou-os a virem fazer uma demonstração aqui.
Enquanto os dois companheiros começam a preparar a comida, Ryu Si Hyeong, de 28 anos, explica, sorridente, quais os ingredientes básicos da cozinha coreana. “Há perto de 300 tipos de kimchi”, diz. O que eles vão preparar é uma espécie de salada, usando a couve (o tipo de couve a que habitualmente chamamos chinesa) crua e misturando-a com uma pasta feita de vários ingredientes.
A base de toda a cozinha coreana é o jang, que pode ter três formas básicas: o ganjang (molho de soja coreano, feito a partir de feijão de soja fermentado), odoenjang (pasta de feijão de soja, também fermentado), e gochujang (a mesma pasta, mas com malagueta vermelha e sal). Um pequeno filme que Ryu nos mostra descreve o jang como “o sabor de um país” e algo que “define os valores da cultura coreana”.
Para fazer o kimchi, os coreanos usam a couve e colocam o gochujang e vários outros ingredientes entre as folhas (nomeadamente pequeníssimos camarões salgados e ostras). É um processo que, feito artesanalmente, demora bastante tempo, um ritual de encontro que se repete há séculos na Coreia e que nasceu da necessidade de preservar os vegetais para ter comida durante o Inverno. As couves são embrulhadas nas suas próprias folhas e colocadas em vasos enormes, que são depois enterrados. Ao fim de alguns meses, a couve fermentada é retirada e já entranhou, de todos os outros ingredientes, o sabor intenso que vamos provar de seguida.
Para já, Ryu está a mostrar-nos os ingredientes básicos, separados em pequenas taças: os três tipos de jang, os camarões salgados, o pó de malagueta, um molho de peixe, óleo de sésamo, e sal com três anos. Todos têm cheiros intensos. Provamos. Os jang são ao mesmo tempo ácidos e picantes, uma fortíssima concentração de sabor, exigente para o palato, mas a que rapidamente nos habituamos.
Via Público