Uma noite. Algumas horas. Três encontros. Quando se trata de um sentimento, intensidade não tem nada a ver com duração, com tempo. Menos ainda com o lugar. Certas histórias de amor são tão breves quanto fulgurantes. E, talvez por isso, tornam-se aquelas que marcam toda uma vida. Nem todo mundo tem a chance de viver uma paixão assim, mas, quem viveu, não esquece jamais
Patrícia Lima, 29 anos, jornalista
“No início de 2006, entrevistei o vocalista de uma banda de heavy metal para a seção de cultura do jornal de Porto Alegre em que eu trabalhava. Ao contrário de vários outros artistas que tive o prazer de entrevistar, aquele, inicialmente, em nada me empolgava. Detesto o som sujo e barulhento dessas bandas que insistem em cha-coalhar a cabeleira como se ainda vivessem nos anos 80. E, por isso, nem me preocupei em escolher uma roupa transada, um perfume bacana ou qualquer outro acessório especial para aquela ocasião. A conversa aconteceu no estúdio fotográfico do jornal, um ‘muquifinho’ sem janelas, com luz fria e charme-zero.
Para variar, cheguei esbaforida e cheia de coisas nas mãos (bloquinho, celular, caneta, gravador). Cumprimentei o fotógrafo, a produtora e ia passar direto pelo entrevistado quando ele, num inglês de barítono, me estendeu a mão e disse: ‘Oi, beautiful lady. Posso te ajudar?’. Olhando para cima, feito uma criancinha quando toma advertência do pai, agradeci — e aceitei — a ajuda.
Bob (vou chamá-lo assim para não dar bandeira de sua real identidade) é um negro espetacular de dois metros de altura, musculatura de halterofilista e olhos de jabuticaba. Ou seja, se musicalmente ele era tudo o que eu mais abominava, fisicamente era perfeito, o ‘meu número’. Comecei a entrevista falando dos desafios do heavy metal no Brasil, da relação dos artistas estrangeiros com o país e uma série de outras coisas que eu só pude escrever na matéria graças ao gravador. Minha cabeça não estava mais ali. Enquanto Bob falava, eu só pensava no quanto seria interessante viver um romance com um popstar dos metais e, de quebra, ‘zoar’ o gatinho com quem eu estava saindo havia meses, mas que teimava em não assumir o namoro.
Na medida em que a entrevista ia terminando, Luli, a produtora que cuidava das imagens, começou a mostrar para o bonitão as opções de looks para as fotos. Encantado com o bom gosto da menina — que além de competente era linda, gente fina e supercharmosa —, Bob perguntava sobre a procedência das roupas: ‘Onde vocês conseguiram arrumar isso? É tão difícil encontrar roupas para pessoas grandes como eu fora dos Estados Unidos. Será que vocês não querem me levar para fazer umas compras aqui?’. Aquela pergunta para mim era um baita banho de água fria. O bonitão, claro, ia ‘pegar’ a bonitinha. E a ‘quatro-olhos’ aqui ia voltar para o ‘serviço’.
Deixei meu cartão com ele, por educação, saí do estúdio e voltei para a redação para redigir a matéria, que fechava naquele dia. No fim da tarde, o momento mais tenso de uma redação de jornal, quando tudo tem de estar quase pronto para ir para a gráfica, tocou meu celular. Era o Bob: ‘Oi, beautiful lady. Desculpe atrapalhar, mas pensei em ligar para combinarmos de fazer umas compras. Você não quer me levar para conhecer essas lojas transadas que vendem roupas para moços grandes como eu?’, perguntou. Olhando o texto na tela do computador e ouvindo os gritos do chefe de arte dizendo que eu precisava fechar logo a matéria, demorei para entender se ele estava me convidando para um ‘date’, como dizem os americanos, ou se ele só queria comprar a tal roupa de gigantes. Na dúvida, fiquei com a segunda opção. ‘Olha, Bob, eu adoraria, mas não posso falar agora porque estou super ocupada. Dá uma ligada para a Luli que ela te ajuda com o lance das grifes.’ Ele ficou sem graça, agradeceu e desligou.
Três horas depois, quando eu já havia saído do jornal, tocou meu celular. ‘Beautiful lady, sou eu de novo. Sabe o que é? Acho que me expressei mal. Adoraria conhecer as grifes que desenham para pessoas grandes, mas como só tenho dois dias no Brasil antes da turnê europeia, acho mais importante conhecer você. Ficaria chocada se eu te convidasse para sair?’ Chocada, eu? ‘Claro que não’, respondi. ‘Seria um prazer.’ Tomei o banho mais rápido da minha vida, sequei o cabelo , fiz uma chapinha nas pontas e coloquei ‘o’ vestido emagrecedor. Toda mulher tem aquele pretinho amigo, não é mesmo?
Fomos jantar em um restaurante indiano maravilhoso, tiramos fotos com alguns fãs de heavy metal que não acreditavam que Bob estava ali, entre os mortais, e terminamos a noite no hotel em que ele estava hospedado. Não posso dizer que foi a melhor transa da minha vida, mas o fato de ele ser ‘um armário’, ter uma pegada incrível e de estarmos falando em inglês fez com que aquilo se tornasse especial. Além disso, ele era famoso e, no fundo, acho que toda mulher tem uma vocação para groupie.
Quatro anos depois, ainda consigo sentir o perfume daquele abraço forte, enorme, protetor. Mesmo estando casada com outro homem — aquele gatinho que não queria me assumir, quem diria, fez (e ainda faz) de mim uma das pessoas mais felizes do mundo quando me pediu em casamento. Ele não sabe nem precisa saber: mas ainda tenho essa deliciosa lembrança de um amor de uma noite que durou para sempre.
Luciana Marins, 33 anos, artista plástica
“Eu gosto de pensar em quantas pequenas coisas precisam ocorrer antes de um grande encontro ao acaso. Foram muitas para que aquele acontecesse comigo. Primeiro viajar até Paris, depois conhecer Marianne, uma francesa tímida e muito simpática, durante uma palestra no seminário do qual estávamos participando e, então, aceitar, por pura educação, o convite dela para irmos naquela noite a um bar próximo à Place de la Concorde. Foi ao sairmos de lá — eu, ela e Luisa, uma amiga brasileira — que encontrei Arnaud.
Via Marie Claire