Desde que vigora o Plano de Assistência Financeira assinado com a troika, o desemprego disparou nos sectores mais dependentes da procura interna. De acordo com os dados do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Fevereiro (que dava conta de 648.018 desempregados, mais 16% do que o mesmo mês do ano passado), quatro em cada cinco desempregados da indústria vieram da construção. E, entre os desempregados dos serviços, cerca de 80% trabalhavam no comércio, no imobiliário, no Estado ou na restauração e hotelaria.
A conclusão retira-se da evolução dos números de desempregados registados nos centros de emprego, por sector de origem. Não são valores que reflictam os fluxos dos novos desempregados. O desemprego registado é um indicador do nível do desemprego, após todos os actos administrativos dos centros de emprego. Ou seja, após políticas activas de emprego, de formação profissional ou mesmo anulação de inscrição como desempregado. Apesar disso, os valores constituem uma amostra significativa da origem dos desempregados inscritos nos centros de emprego.
A vantagem destes dados é que tornam possível traçar um retrato da actual crise, através dos níveis do desemprego sectorial.
Primeiro, pelo perfil da anterior fase de subida do desemprego em 2009, tudo indica que o desemprego apenas começou agora a subir. O ponto de inflexão da trajectória ascendente parece ainda estar longe. Essa tendência é corroborada pelos fluxos de novos desempregados. Em Fevereiro passado, foram mais 60 mil pessoas, ou seja, mais 20% do que no mesmo período de 2011.
Depois, verifica-se que é o desemprego nos serviços que está a marcar o desemprego registado nos centros de emprego. Enquanto na fase anterior de subida do desemprego, a indústria e os serviços contribuíram com um número semelhante para a subida do desemprego, agora o perfil é outro.
Por cada dez desempregados inscritos em Fevereiro, sete vieram dos serviços e três da indústria. Mas a esmagadora maioria deste desemprego industrial não vem da indústria transformadora, mas sim da construção. Aliás, o sector industrial tem um contributo algo desigual. Enquanto o sector têxtil, vestuário, couro, madeira e cortiça e automóvel estão com recuo no desemprego face ao que se passou em 2011, há sectores que estão a alimentar o desemprego. É o caso do sector alimentar, mobiliário, metalúrgico e, depois em menos escala, o do papel, dos produtos petrolíferos e electricidade.
Em terceiro lugar, além da construção civil, os sectores dos serviços que estão a contribuir, de sobremaneira, para a subida do desemprego registado vêm de actividades fortemente dependentes da procura da generalidade da população.
Por cada dez desempregados dos serviços, quatro vieram do imobiliário, seguindo a queda da construção civil. Dois vieram do comércio, outros dois do Estado e mais um da restauração e hotelaria.
Por outras palavras, a subida do desemprego mais recente pode estar a ser explicada, primeiro, pela queda do sector imobiliário, após a descida acentuada dos rendimentos, ligado ao desemprego. Depois, pela contracção das despesas públicas e pelos esforços de redução dos quadros de pessoal do Estado. E como corolário pela retracção das actividades comercial e restauração e hotelaria, agravadas ainda pelas medidas de austeridade.
Este perfil de desemprego tem outra expressão quando se analisa as profissões dos desempregados. Cerca de 27% dos desempregados eram operários da indústria ou construção, a que se somam mais 5% de actividades de engenharia. Depois, cerca de 20% são trabalhadores não qualificados. Os trabalhadores de escritórios representam 10% dos desempregados. E há ainda mais 3% de trabalhadores com actividades geralmente ligadas a funções públicas - educação, saúde.
O perfil é semelhante quando se analisa quais são as profissões com maiores subidas nos últimos meses. Os trabalhadores não qualificados e operários da indústria ou construção são os primeiros. O mesmo acontece com os vindos dos escritórios, dos serviços de protecção e segurança e vendedores. Nos quadros de direcção, enquanto o desemprego entre os quadros superiores da Função Pública parece ter-se atenuado, os directores de empresas e gerentes de pequenas empresas estão a contribuir para a subida do desemprego.
Via Público